Tragédia no litoral norte deixou até o momento 54 mortos e outras dezenas de desaparecidos em meio à lama.
Cubatão ainda tem muitos problemas habitacionais, fruto do crescimento desordenado da cidade nos anos de ouro da industrialização da região, porém, há de se reconhecer que Cubatão é exemplo quando se trata de recuperação ambiental e principalmente de remoção de famílias em áreas de risco.
Com casos como a tragédia ocorrida no litoral norte, onde até o momento 54 pessoas morreram em decorrência das fortes chuvas e deslizamento de terra, devemos fazer a seguinte reflexão; “E se morro do Pica Pau, Cota 95 e Grotão não tivessem sido extintos”, quantas mortes estaríamos contabilizando hoje?
A verdade é que a política pública necessária para o bem da população nem sempre é a mais popular ou compreendida de imediato por quem é assistido, por isso, quase nunca está nos planos dos governantes, afinal quem quer ser impopular quando a maior moeda de troca é o voto?
Em Cubatão, a partir de 1997, foi iniciado o programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar, unindo as secretarias estaduais de Meio Ambiente e da Habitação, incluindo a Fundação Florestal, a Cetesb, o Instituto de Botânica e o CDHU. Juntas, acionaram a Polícia Militar Ambiental e o IPT.
A condição número 1 era oferecer moradia decente a quem viesse a ser remanejado, e os novos conjuntos habitacionais teriam que estar próximos. Quem quisesse se mudar para longe, acessava uma espécie de indenização em dinheiro. Tinha que sair dali, pois além dano ambiental causado pelas construções irregulares, era inegável que a qualquer momento a tragédia poderia ocorrer, eram milhares de pessoas vivendo em morros e encostas em uma região onde frequentemente chuvas torrenciais ocorrem.
Uma preliminar se cumpriu: a Polícia Ambiental garantiu o “congelamento” das ocupações, instalando barreiras nos seus acessos. Chefe da operação, o coronel Eclair Borges, ex-comandante geral da PM, mobilizou 76 policiais e 10 viaturas. Acabou a bagunça.
Nenhum caminhão mais entrou nos núcleos levando material de construção. Mudança, só para ir embora. Quinzenalmente se realizava o levantamento fotográfico, por helicóptero, dos telhados das residências. Qualquer alteração sofrida era investigada.
Tarefa digna de Hércules, tamanho o pepino da região. Assim se referiu à ação governamental o conceituado site O Eco, na reportagem “As cicatrizes no verde da Serra do Mar”.
O maior desafio no entanto, além da vontade política de manter o programa pouco compreendido na época, era o de convencer a população que aquilo era NECESSÁRIO.
Mensalmente, técnicos, da Habitação e do Meio Ambiente estadual, realizavam entrevistas, reuniões e audiências públicas.Tudo para avançar no programa, auxiliado por Rubens Lara, que coordenava a Agência Metropolitana da Baixada Santista.
Tendo em mãos o laudo técnico do IPT, que identificava uma a uma as residências em situação de risco, a CDHU visitava seus moradores fazendo a pedagogia da mudança, explicando e convencendo a população da necessidade da obra. Tudo na maior transparência.
Incrivelmente, funcionou. Durante os próximos 6 anos, entre 2008 e 2012, cerca de 5.350 famílias iriam ser removidas de suas precárias moradias; outras 1.900 residências permaneceriam em perímetros que foram reurbanizados. O dispêndio público ultrapassou os R$ 700 milhões. Parte dos recursos vieram do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).
O êxito do programa chamou a atenção internacional. Em junho de 2014, o príncipe Harry, do Reino Unido, visitou a comunidade do bairro Cota 200. Conferiu de perto a recuperação ambiental da área. No total, 900 mil metros quadrados de construções cederam lugar à floresta em regeneração.
Com o sucesso do programa em Cubatão ,era necessário expandi-lo, até porque os eventos climáticos extremos estavam já conhecidos. A 2ª etapa previa atender outras 25 mil famílias em áreas de risco socioambiental, espalhadas por 13 municípios, incluindo o Litoral Norte. Previa a construção de novas 16 mil unidades habitacionais. Haveria intervenção em 112 áreas, sendo 68 consideradas de alta pressão.
Em São Sebastião e Ubatuba, foram identificadas 389 moradias irregulares, situadas dentro do Parque da Serra do Mar. Havia uma situação crítica: a ocupação desordenada nas encostas da Barra do Sahy.
Passaram-se os anos.Os próprios moradores eram contra o programa de remoção. Assim como aconteceu em Cubatão, a resistência popular era grande, porém desta vez, o poder público pouco fez para resistir, hoje, justamente em uma das áreas apontadas como de risco e que deveria ter sido removida, assim como ocorreu em Cubatão, é palco de uma das maiores tragédias do litoral norte, que estava anunciada há tempos.
Cubatão segue no caminho da reurbanização e recuperação Socioambiental com os mesmos desafios do passado, convencer a população de que esta é a política NECESSÁRIA a todos.
O prefeito da cidade, Ademário Oliveira, iniciou o audacioso processo de reurbanizacao da maior favela da Baixada Santista, a Vila Esperança, onde aproximadamente 35 mil pessoas vivem amontadas em barracos e palafitas, segundo o prefeito da cidade, o processo de reurbanização do bairro deve levar pelo menos 10 anos. No início de 2023, Ademário anunciou também ter conseguido recursos para a reurbanização da Vila dos Pescadores, outra comunidade que vive em situação degradante.